HOMILIA NO XV DOMINGO COMUM C 2025
1.Esta parábola, talvez a mais famosa de todas, fora do culto e do circuito dos cristãos, está cheia de provocações, que o calor do verão não aconselha explorar ao pormenor. Quase em jeito de notícia de jornal, podíamos escrever sobre o bom samaritano: “um estrangeiro, que nem falar sabe, curou e salvou um homem ferido na estrada”; ou “um estrangeiro, sem religião, explicou ao padre e ao sacristão o que significa tornar-se próximo do outro”. Ou ainda “um herege maldito, que nem ia para a missa, compadeceu-se de um homem ferido”. Se os títulos do jornal fossem sobre o sacerdote e o levita, diriam talvez: “Dois homens puros não quiseram sujar as mãos”. Se o foco da notícia fosse a vítima, diriam os jornais com base no Evangelho: “um homem ferido, sem cartão de identidade, sem carteira profissional, foi bem tratado por um estrangeiro”. Se os títulos fossem formulados em perguntas, não diriam já: «Quem é o meu próximo?», mas sim «De quem sou eu próximo?». Precisamos de reconhecer em nós a tentação de nos desinteressarmos, de nos descartarmos dos mais frágeis. Crescemos muito em ciência, conhecimento e tecnologia, mas somos hoje mais analfabetos no acompanhar, no cuidar e sustentar os mais frágeis e vulneráveis. Habituamo-nos a olhar para o outro lado, a passar à margem, a ignorar as situações até elas nos caírem diretamente em cima (FT 64).
2.Mas deixemo-nos, por um momento, destas provocações e transgressões! E já que estamos de malas feitas, para as viagens de verão ou para as peregrinações jubilares, fixemo-nos apenas num pormenor da parábola: o samaritano ia de viagem; o samaritano estava a caminho. Os outros dois, sacerdote e levita, não viajavam, simplesmente exibiam e passeavam a sua classe: eram um adorno no caminho! Ao contrário, aquele Samaritano, embora tivesse os seus programas e se dirigisse para uma meta distante, não arranja desculpas e deixa-se surpreender e interpelar, pelo que casualmente acontece ao longo do seu caminho. Devemos olhar para longe, ter os olhos postos na meta final, contudo devemos prestar muita atenção aos passos que devemos dar, aqui e agora, para lá chegar. Não se pode ir em direção à meta, passando ao lado da vida e dos outros. Como o samaritano, chegaremos a Deus e à Sua Casa, desviando-nos, aproximando-nos, para vermos o próximo, nos compadecermos e nos inclinarmos diante dele!
3.Dizia o saudoso Papa Francisco aos jovens e continua a dizê-lo a nós, neste ano jubilar: “O convite que vos faço é para que vos coloqueis a caminho, para descobrir a vida, nas pegadas do amor, em busca do rosto de Deus. Mas o que vos recomendo é o seguinte: não partam como meros turistas, mas como peregrinos. Isto é, que a vossa caminhada não seja apenas uma passagem pelos lugares da vida de forma superficial, sem captar a beleza do que encontrais, sem descobrir o sentido dos caminhos percorridos, captando só breves momentos, experiências fugazes registadas numa selfie. O turista faz isso. O peregrino, pelo contrário, mergulha de alma e coração nos lugares e pessoas que encontra, fá-los falar, torna-os parte da sua busca de felicidade. A peregrinação jubilar quer, portanto, tornar-se o sinal do caminho interior que todos somos chamados a fazer para chegar ao destino final” (Mensagem JMJ 2024).
4.Não viajemos, nem peregrinemos, para fugir da realidade, para passear e passar ao lado dos outros. Desloquemo-nos, para visitar e ajudar alguém em dificuldade, como que fazendo uma peregrinação, em direção a Cristo, presente nos mais pobres, frágeis e sós. Irmão, irmã: Faz-te ao caminho, como o bom samaritano, que ia de viagem. Passando junto do homem ferido, viu e encheu-se de compaixão. Vai e faz o mesmo. E para que tal seja possível, seja hoje esta a tua prece: “Senhor, que eu veja, que eu tenha compaixão, como Tu me vês e tens compaixão de mim!”