Liturgia e Homilia no III Domingo de Páscoa C 2016

Suportar com paciência as fraquezas do nosso próximo!

1. Esta é a sexta obra de misericórdia espiritual, que nos propomos viver, nesta terceira semana da Páscoa. Dita assim, ou, na pior tradução, «suportar com paciência as pessoas molestas»,nem parece uma obra de misericórdia! Dá-nos a impressão, à primeira vista, de que já não há nada a fazer, «perante as pessoas molestas» ou aborrecidas, que nos carregam ou sobrecarregam de problemas, que se nos tornam pesadas, difíceis de aturar, de suportar. Mas a paciência de Jesus ressuscitado, com os Seus discípulos, na Sua terceira aparição, e o testemunho alegre dos Apóstolos, perante os ultrajes, ajudam-nos a viver retamente esta obra de misericórdia.

2.Talvez pudéssemos decompor a formulação desta obra de misericórdia em três partes, para a compreender melhor: 1.ª - o verbo «suportar; 2.ª - o advérbio de modo «com paciência» e 3.ª - o «objeto humano» da ação: «as fraquezas do nosso próximo». Vamos então por partes:

2.1. «Suportar»! É uma palavra pouco simpática, mas no fundo traduz este dever moral de “carregarmos a carga uns dos outros” (Gl 6,2). Suportar significa ser «mais forte», para apoiar, para arcar com o peso do outro, que cai ou recai sobre nós. Quem está alicerçado em Cristo, enraizado e firme n’Ele, não se deixa amolecer, ou ir abaixo, perante as dificuldades. Quem suporta o outro, mostra-se afinal mais forte do que ele. E é preciso suportar, com amor, porque «o amor tudo suporta» (Ef 4.1-2; 1 Cor 13,7). A este título, recordo uma parábola africana: «Num caminho escarpado, um homem encontra uma menina que carrega às costas uma criança quase do tamanho dela. Disse-lhe o homem: “Tens aí um fardo pesado”. Respondeu-lhe a menina: “Não é um fardo! É o meu irmão”. As palavras desta criança ficaram sempre gravadas no seu coração. A partir dali, quando os homens o dececionam e a coragem o abandona, o homem recorda-se: “Não estou a carregar um fardo; é o meu irmão”» (Guy Gilbert, Perdoar as injúrias, Ed. Paulinas: Prior Velho, 2015, p.49).

Mas “suportar” significa também resistir sem se enervar, dominar-se sem se descompor, pois “dominar-se a si mesmo, vale mais do que conquistar uma cidade” (Pr16,32). Significa suportar as injúrias e as crueldades pacientemente, sem se deixar perturbar, encontrando aí a perfeita alegria, como nos diz São Francisco, e de que são um belo exemplo os Apóstolos, «que saíram da presença do Sinédrio, cheios de alegria, por terem merecido ser ultrajados, por causa do nome de Jesus». Suportar significa “resistir ao mal com o bem” (Rm 12,21), não retaliar, recusar o ataque, perseverar e mostrar firmeza (Rm 12,12),diante das perseguições. “É uma graça do Espírito Santo poder vencer-se a si próprio e suportar, de boa vontade, por amor de Cristo, penas, injúrias, ultrajes e incomodidades” (São Francisco).

2.2. «Com paciência». Não se trata aqui de resignação, demissão ou indiferença e passividade, frente ao esforço de correção, de melhoria e de mudança. Não. Suportar com paciência significa mostrar firmeza, recusar o ataque, manter a calma, perante as situações irritantes, ao mesmo tempo que nos dispomos a aguardar com expetativa (Rm 8,24-25), a aceitar a lenta maturação das pessoas, sem perder a esperança de “melhores dias”. Isto mesmo faz Jesus, com os Apóstolos, que O traíram e negaram, que se mostravam “lentos de espírito para compreender” o mistério da Sua morte e ressurreição. Jesus aparece-lhes e manifesta-Se, uma e outra vez, uma terceira vez, e as vezes que forem necessárias, até que amadureçam, na fé e na esperança, até que se tornem capazes de O seguir e servir até ao fim. Não por acaso, São Paulo coloca como primeiro atributo do amor a paciência (1 Cor 13, 4), sem a qual a esperança e a fé, não chegam a dar fruto.

2.3. «As fraquezas do nosso próximo». Estas parecem-nos traves intoleráveis e insuportáveis. Mas um olhar atento sobre o argueiro dos nossos defeitos e feitios, dos nossos pecados e debilidades, rapidamente nos leva a usar de mais paciência e misericórdia, para com o próximo, tal como Deus o faz connosco, porque é um «Deus paciente e misericordioso» (MV 6). Suportar com paciência as fraquezas do nosso próximo impede-nos de nos precipitarmos a julgar os outros e ajuda-nos a «valorizar o que há de bom em cada pessoa» (MV 14). “Quem se impacienta com os defeitos do outro, tem nisso a prova da sua imperfeição” (S. Gregório Magno).

3. Irmãos e irmãs, para vivermos bem esta sexta obra de misericórdia, invoquemos a sabedoria e a fortaleza do Espírito Santo e rezemos, com São João XXIII:

 

Senhor, dai-me coragem para mudar o que deve ser mudado,

Serenidade, para aceitar o que não pode ser mudado

E sabedoria, para distinguir uma coisa da outra.

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